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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O desafio da destinação dos resíduos sólidos - Matéria Capa Edição 31

Comprometimento com a logística reversa é o primeiro passo para que Governo, entidades e empresas se ajustem à política nacional e avancem quanto à sustentabilidade de seus processos.

Jornalista Bruna Robassa

No dia 23 de novembro de 2012, indústrias dos mais diversos setores e representantes do comércio paranaense deram um importante passo para a correta destinação de seus resíduos sólidos e, consequentemente, avançaram em relação à busca e ao aprimoramento da sustentabilidade para seus processos e negócios.

Convocados pelo edital de chamamento 01/2012, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos de significativo impacto ambiental têm como missão “implantar um programa de responsabilidade pós-consumo para fins de recolhimento, tratamento e destinação final de resíduos sólidos, indicando o conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a destinação dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para que sejam reaproveitados em seu ciclo, ou em outro ciclo produtivo, ou então para outra destinação final ambientalmente adequada”.

É o que explica Luciano Henrique Busato, analista técnico da coordenação de desenvolvimento do setor de Fomento e Desenvolvimento do Sistema FIEP, entidade que, junto a sindicatos e outras associações, como a Associação Comercial do Paraná, (ACP) está envolvida com a mobilização que visa a elaboração de um plano estadual setorial de logística reversa.

Após diversas reuniões e discussões sobre medidas setoriais de médio e longo prazos, foi que, no dia 23 de novembro, 62 sindicatos patronais e a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), representando outros 37 sindicatos de um total de 99 sindicatos representados, assinaram um termo de compromisso vinculado à agenda setorial para o ano de 2013. “O termo é um documento que formaliza a intenção dos setores e empresas a aderir a uma agenda de comprometimento para a realização de um plano setorial de logística reversa. Uma vez que o sindicato tem a função de articular junto aos seus associados a construção de um plano de logística reversa setorial para ser discutido pela cadeia produtiva a partir do primeiro semestre de 2013”, relata o analista.

Plano Estadual

Tanto o edital de chamamento quanto a assinatura desse termo de compromisso fazem parte do Plano Estadual de Resíduos Sólidos (PERS), que busca modificar, de forma gradual, o comportamento e os hábitos da sociedade paranaense, no que se refere à destinação ambientalmente adequada dos resíduos sólidos. É importante lembrar-se de que o plano estadual está alinhado à política nacional (Lei n.º 12.305/2010). De acordo com o coordenador de Resíduos Sólidos da Sema, Carlos Garcez, o PERS é condição para que os estados tenham acesso a recursos da União destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos a partir de 2 de agosto de 2012.

“O PERS deverá abranger todo o território do estado, para um horizonte de vinte anos com revisões a cada quatro anos, observando o conteúdo mínimo definido pelo Art. 17 da Lei. Além disso, o PERS deve estar em consonância, principalmente, com os objetivos e as diretrizes dos planos plurianuais (PPA) e de saneamento básico, e com a legislação ambiental, de saúde e de educação ambiental, entre outras”, conta Garcez.

Redação da lei

O professor universitário e advogado paranaense Rafael Favetti, que fez parte do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Governo Federal por 8 e 5 anos, respectivamente, participou da redação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e conta que a temática dos resíduos sólidos foi um dos assuntos que necessitaram da participação do Ministério da Justiça, em especial quanto à verificação da legalidade do novo ordenamento proposto, enquanto o advogado lá atuava. Segundo ele, por tratar de tema atual, a lei apresenta conceitos bastante modernos em relação ao assunto.

“Um destaque interessante é que a aplicação da lei ocorre tanto para pessoas físicas quanto jurídicas. Dessa forma, todos estão envolvidos e devem observância às diretrizes estabelecidas”, ressalta. Para o advogado, além deste, os maiores destaques da lei são exatamente a elaboração de um plano de logística reversa e a assinatura do acordo setorial. Favetti também conta que a lei contempla a criação de um Sistema de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos, conhecido como SINIR, que visa o auxílio das organizações na gestão dos resíduos, propiciando maior atendimento às diretrizes do plano.

A discussão sobre resíduos sólidos é tema relativamente recente para o Governo. “Em 1999, foi proposto projeto de lei que objetivava regular o acondicionamento, a coleta, o tratamento, o transporte e a destinação dos resíduos de serviços de saúde. Pode-se destacar, porém, como marco inicial da criação de diretrizes sobre o assunto o ano de 2004, ocasião em que o Ministério do Meio Ambiente instituiu um grupo técnico de pesquisa sobre o tema. Então, após inúmeros fóruns de discussão e audiências públicas realizadas, foi aprovada a Lei nº 12.305, em 2 de agosto de 2010”, lembra o jurista.

Muitos pontos foram ponderados durante a elaboração da lei. A principal dificuldade, segundo conta Rafael Favetti, foi justamente procurar estabelecer diretrizes que tivessem como objetivo a prática de bons hábitos ambientais, mas sem prejudicar os destinatários dela. “A adequação às diretrizes traçadas pela lei deve transpor a mera obediência, mas se tornar efetiva conscientização ambiental. Note-se que as empresas, para adequação à lei, poderão ser obrigadas a desenvolver novas práticas de atuação, no sentido de observar o que consta dos planos de resíduos sólidos”, lembra.

Nicolau Leopoldo Obladen, engenheiro civil e sanitarista, ex-professor de saneamento ambiental, hoje diretor técnico da empresa Habitat Ecológico – Consultores Associados, também destaca como principais temas envolvidos com a PNRS o ciclo de vida dos produtos, correspondente ao processo de planejamento, desenvolvimento do produto, obtenção da matéria-prima e descarte final, a coleta seletiva de materiais recicláveis com a participação das associações/cooperativas de catadores, o encerramento dos lixões até agosto de 2014, e a formalização de consórcios públicos intermunicipais.

Como se organizar

Na opinião de Favetti, as empresas, inicialmente, devem analisar seu atual modelo de gestão de resíduos sólidos. Para tanto, é necessário coletar dados sobre a geração de resíduos e determinar seus principais destinos. Por fim, é necessário estabelecer metas de redução e diretrizes para a implantação de um plano de gerenciamento que se adeque à realidade e às necessidades da empresa.

O professor universitário ainda defende que, apesar de ser importante o compartilhamento de informações tanto com entidades representativas bem como com os respectivos setores para que haja convergência de opiniões e ideias, é essencial cada empresa elaborar minuciosamente seu próprio plano de gerenciamento.

É como pensa também Nicolau Leopoldo Obladen. “As empresas deverão enfrentar a elaboração de seus próprios PGRS (Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos), por iniciativa própria e individualmente. Não existem possibilidades de união entre empresas, em virtude da tipicidade variada dos resíduos gerados em cada empresa com características específicas, sob a supervisão dos órgãos ambientais”, diz.

Nas discussões e reuniões realizadas por conta do edital de chamamento da Sema, inclusive, atitudes das empresas que já tinham preocupação com a destinação de seus resíduos acabaram virando uma regra para outras indústrias do setor, como é o caso das indústrias de alimentos, especialmente as avícolas.

Exemplos

O investimento em cooperativas de reciclagem e a educação ambiental foram as melhores alternativas encontradas pelas indústrias do setor para o plano de logística reversa. Para Fábio Guerlles, biólogo responsável pela área ambiental do Grupo GTFoods, indústria avícola de Maringá, e um dos integrantes do grupo que representa o setor de alimentos, o retorno de embalagens provenientes das indústrias de alimentos, especialmente as avícolas é muito difícil de acontecer. “No caso da indústria de bebidas, o retorno é facilitado com a instalação de pontos de entrega voluntário, no entanto, para embalagens de isopor e plástico, como é o nosso caso, a melhor solução para viabilizar a logística reversa é o investimento em cooperativas”, explica.

O Grupo GTFoods, como diversos outros abatedouros avícolas, já costuma prestar incentivo às cooperativas, trabalhando em parceria na doação de materiais recicláveis para coleta. “Ao incentivar que as cooperativas utilizem nossos materiais no processo de reciclagem, com investimentos na melhoria de sua estrutura e em equipamentos de coleta, estamos criando uma alternativa para aumentar a retirada de materiais com potencial de reutilização do meio ambiente, ou seja, estamos proporcionando a logística reversa”, explica.

A Associação Brasileira das Empresas de Filtros e seus Sistemas - Automotivos e Industriais – Abrafiltros também já tem seu plano de logística reversa. De acordo com João Moura, presidente da entidade, desde a fundação da associação, em 2006, “já antevíamos que o Brasil adotaria um modelo de ação voltado à logística reversa em função das discussões mundiais em torno da preservação do meio ambiente”, conta.

Moura ainda relata que a associação acompanhou o desenvolvimento e posterior publicação da PNRS, ao mesmo tempo em que foi buscando conhecimento acerca dos aspectos envolvidos para a instituição de um programa de responsabilidade pós-consumo para os filtros do óleo lubrificante automotivo.

Por ser uma entidade nacional representativa do setor, a Abrafiltros buscou inicialmente por meio de comunicados e anúncios, alertar e conscientizar as empresas da cadeia de filtros automotivos acerca da necessidade de estabelecer um programa de responsabilidade pós-consumo, o qual a entidade denomina de “Descarte Consciente Abrafiltros”. A associação atua na gestão do programa, que iniciou em julho de 2012, e os custos são compartilhados entre as empresas participantes.

O programa principiou no estado de São Paulo e será iniciado a partir de fevereiro no Paraná, conforme os termos de compromisso assinados com os governos estaduais. “Nosso programa consiste na coleta dos filtros usados diretamente nos geradores (locais onde é feita a troca dos filtros), como os postos de combustível, uma vez que o consumidor brasileiro não tem por hábito realizar a substituição em casa. Por questão de proporcionalidade, fabricantes e importadores compartilham os custos de coleta conforme o volume comercializado com marca própria em cada estado, de acordo com as metas gradativas de coleta para o setor”, explica.

Em função dos aspectos logísticos e econômicos envolvidos, o projeto está sendo realizado na condição de programa-piloto para que seja possível analisar os resultados e buscar minimizar os impactos, tanto para as empresas quanto para os consumidores. “Entendemos que a logística reversa é necessária e que as empresas deverão se adaptar a essa nova realidade, ainda incipiente no Brasil, que certamente demandará uma série de ajustes entre o poder público e a iniciativa privada. Entendemos que será de grande importância que o governo federal e os governos estaduais atuem como parceiros na instituição de políticas de incentivo às empresas engajadas com a logística reversa pós-consumo”, reflete.

Dificuldades do setor

Ainda de acordo com João Moura, a principal dificuldade do setor em elaborar e cumprir um plano de logística reversa é que “diferente de outros tipos de resíduos, os filtros do óleo lubrificante automotivo não podem ser reaproveitados, por isso, tudo o que se relacione à logística reversa acaba resultando em custo e não há retorno direto para a cadeia de filtros”, relata. Mesmo assim, 13 empresas do setor já aderiram simultaneamente ao projeto na assinatura do termo de compromisso. “Outras empresas estão em processo de filiação à Abrafiltros para participar do programa, que está aberto a novas adesões”, convida o presidente.

Responsabilidade compartilhada

Tania Kamienski, da Associação Comercial do Paraná (ACP), defende e ressalta que tanto a ACP como a indústria e os próprios consumidores têm responsabilidade pelo destino final dos resíduos sólidos. Ela destaca, inclusive, que a responsabilidade compartilhada está prevista em lei. “A relação do comércio é direta com o consumidor, por isso teremos que atender a política em respeito ao nosso consumidor e ao meio ambiente. Levaremos algum tempo para acostumar, mas logo será rotina nas empresas”, diz.

É como pensa também um dos redatores da lei. “Acredito que sempre deve haver o diálogo entre a iniciativa pública e a privada, bem como a participação de uma sociedade interessada e capaz de exprimir seus anseios. Devemos nos conscientizar que as empresas, o governo e a sociedade são interdependentes e precisam dialogar sobre temas relevantes”, defende Favetti.

A responsabilidade deve ser compartilhada no momento de colocar o plano em prática, assim como foi na elaboração da política estadual e do plano setorial de logística reversa. Segundo conta Carlos Garcez da Sema, o plano estadual foi elaborado em um processo de discussão conjunta em oito encontros regionais com municípios, setor produtivo, sociedade civil organizada e outros atores.

Custo

Tania ainda conta que desde que a lei foi aprovada, a ACP tem participado junto à Fiep e aos sindicatos de todos os setores para que seja possível encontrar soluções que viabilizem o cumprimento da PNRS. Ela destaca, também, que o processo de logística reversa tem um preço alto. “O preço da logística reversa e o local para armazenagem dos resíduos no comércio são certamente nosso maior desafio. Muitos pequenos comerciantes não têm espaço nem para os estoques deles”, conta.

O engenheiro Nicolau Obladen também aponta o alto custo como um dos principais desafios para implantação dos processos. “A lei foi muito bem trabalhada por cerca de 20 anos, mediante ampla participação da sociedade, de técnicos da área, acadêmicos e representantes de instituições públicas e privadas envolvidas no tema em questão. Não vejo falhas, vejo dificuldades em sua implementação e, principalmente, a sustentabilidade financeira dos sistemas a serem implementados ou complementados”, analisa.

Apesar do custo elevado, o comércio poderá fazer a sua parte, tanto que também firmou termo de compromisso com o Governo. “Nesse termo, estabelecemos que serão feitas parcerias com universidades para que cada comerciante possa elaborar seu plano de gerenciamento de resíduo a um custo menor. Também foi estabelecido que a ACP fará um levantamento da quantidade de resíduos e quais são eles para nortear os comerciantes a destiná-los corretamente”, conta ela.

Sanções

Segundo Favetti, não se tratam de sanções as consequências para as empresas que não se mobilizarem para a correta destinação de seus resíduos. Ele conta que no caso dos governos – estaduais ou municipais - a principal consequência da não adequação da lei (conforme os artigos 16 e 18) é a impossibilidade de “acesso a recursos da União, ou por ela controlados”.

Em relação às empresas, por exemplo – tendo em vista o que aponta o Art. 24 – o processo de licenciamento ambiental do empreendimento ou atividade deve conter o plano de gerenciamento de resíduos, sob pena de não ser aprovado.

“Ainda é interessante lembrar que conforme o parágrafo único do Art. 29, aqueles que forem responsáveis por evento lesivo ao meio ambiente ou à saúde pública relacionado ao gerenciamento de resíduos sólidos, deverão ressarcir integralmente o poder público pelos gastos decorrentes das ações empreendidas a fim de minimizar ou cessar o dano causado”, adverte.

Avaliação

A avaliação quanto à mobilização do Paraná para adequação ao plano é bastante otimista. As empresas, cada vez mais, exercem suas atividades com responsabilidades social e ambiental, isso é uma importante constatação. “A implementação da logística reversa é fato louvável, até porque contribui de forma significativa para o reaproveitamento de produtos e materiais, diminuindo os prejuízos causados ao meio ambiente. No entanto, ainda há muito para caminhar. O desconhecimento do tema e a lamentável ausência de conscientização ambiental ainda são obstáculos a serem transpassados”, analisa Favetti.

“Tenho participado da discussão nacional e acredito que no Paraná estamos avançados. Há uma união dos setores para que o PNRS aconteça de verdade e possamos dar o exemplo ao Brasil”, avalia Tania, da ACP. Ainda, segundo ela, a união de todo setor produtivo é essencial para barateamento dos custos. Ela também acredita que a PNRS vai ser uma grande oportunidade de geração de emprego e de criação de novas tecnologias para reciclar materiais. “Acredito que incentivos fiscais para as empresas que precisaram ser criadas para que a PNRS aconteça é essencial para toda a cadeia da reciclagem”, diz.

Próximos passos

Após a assinatura do termo de compromisso em 2012, o próximo passo para a logística reversa é o cumprimento da chamada Agenda 2013, conforme explica Luciano Busato da FIEP. “A FIEP, por meio da Coordenação de Desenvolvimento, articulará e dará apoio técnico para a realização das reuniões setoriais e cumprimento da Agenda 2013. Entre março e junho de 2013, acontecerão as primeiras 17 reuniões setoriais conforme agenda pré-definida, como resultados dessas reuniões, em 60 dias os setores apresentarão um cronograma de atividades para a elaboração, num prazo de 180 dias, de estudo e/ou plano setorial de logística reversa”, conta.

“Difícil prever quando observaremos resultados efetivos. O importante é que as empresas buscam, cada vez mais, atuar de forma responsável. A intenção da Lei nº 12.305/2010 é estabelecer diretrizes gerais aplicáveis aos resíduos sólidos para orientar as empresas, os estados e os municípios na adequada gestão desses resíduos”, analisa Favetti.


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Matérias:

- Entrevista: Marina Silva
- Visão Sustentável: Cativa Natureza - beleza de forma sustentável
- Tecnologia e Sustentabilidade: Parana Metrologia - Da teoria para a prática
- Responsabilidade Social Corporativa: (Cpce Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial) Realização de 2012 e Projetos 2013
- Desenvolvimento Local: A sustentabilidade como inspiração (WTC)

Artigos:


- Artigo: O "Pibão" da Presidenta Dilma (Jerônimo Mendes)
- Artigo: O Marketing e o ciclo de vida sustentável de produto (Hugo Weber Jr)
- Artigo: Turismo Sustentável - Have you heard about it? (Rosimery de Fátima Oliveira)

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