De nossa Proto-História emergem registros de um território que era chamado pelos egípcios, País de Punt, com o qual mantinham intensas relações comerciais e culturais. Séculos após, os romanos o chamaram de País dos Aromas, dado ao fornecimento de incenso, mirra e demais especiarias, aos imperiais de então. Contemporaneamente, os dados e informações sobre essa terra, que teria tudo para ser desenvolvida, dizem-nos ser ela rica em petróleo, minérios, produtos pesqueiros, situação geográfica privilegiada, uma só religião, com dois idiomas oficiais, o que é raro no continente africano.
Refiro-me à Somália, que ocupa o extremo nordeste do denominado Chifre Africano, país que nunca foi formalmente colonizado, pois repeliu com sucesso o Império Britânico por quatro vezes, sendo, pela fama e resistência, reconhecido como aliado pelos Impérios Otomano e Alemão; manteve-se durante a Primeira Guerra Mundial como o único poder muçulmano independente na África. Geoestrategicamente, por estar no Golfo de Áden, rota que une o Índico ao Atlântico, deveria desfrutar de algum poder geopolítico, uma vez que as frotas comerciais entre a Ásia e a Europa, passam em suas portas, transportando inclusive o petróleo do Oriente Médio.
Tudo para desfrutar do bem-estar social e de alguma perspectiva sustentável. Mas não é assim.
Em 1960, a Somália alcança a independência definitiva, cujo governo democrático dura apenas 9 anos – em 1969, Mohamed Barré, por meio de um golpe de estado, instala uma ditadura explicitamente apoiada pelos Estados Unidos, cujas companhias petrolíferas conseguem contratos “privilegiados” de exploração do petróleo somali. E é nesse ponto da História em que desabam algumas teses (como a de que países pobres “já surgiram fadados à ignomínia, dada a sua incompetência e ausência de recursos”), e confirmam-se as evidências sobre a eternização do imperialismo das grandes potências. Potências armadas, pois exauridas em seus próprios “recursos” naturais, dada a gana consumista e a gastança sem limites, encontram-se escandalosamente combalidas, como deixa clara a mídia diária sobre as economias estadunidense e européia, destacadamente.
Alguns dados atuais sobre a Somália envergonham a humanidade: mais de 300 mil mortos em conflitos civis há 20 anos, com um governo não-funcional que mal controla a capital, Mogadíscio; 10% das crianças morrem ao nascer e 25% antes dos 5 anos; 75% da população é subnutrida (o maior índice do planeta). Renda per capita de US$ 220 (a do Brasil é de US$ 8.114 – dados de 2009); 1,6% de água potável e apenas 21% da população têm acesso a ela; estarrecedores índices de câncer, intoxicações, doenças de pele, hemorragias gástricas, nascimentos com malformações e enfermidades. Além da ganância dos interesses petrolíferos, há outros fatores causais desta tragédia, segundo informações de várias fontes, inclusive de agentes da ONU:
a- frotas pesqueiras estadunidenses, europeias e asiáticas, há décadas saqueiam o pescado em águas somalis, praticando a conhecida IUU: Pesca Ilegal, Não-Regulada e Não-Declarada (do inglês: Illegal, Undeclared and Unregullated Fishing). Prática massiva em que, só a Espanha e França, respondem por aproximadamente 500 mil toneladas de atum/ano, usurpando fonte protéica de um País esfomeado;
b- lixo tóxico (metais pesados), rejeitos radioativos de Urânio e hospitalares vêm sendo descarregados nas águas somalis, por países dos mesmos blocos, em estimativas de 600.000 toneladas, só em 2011 e que afetam também a Costa do Marfim, a Nigéria, o Congo e o Benin. Daí as patologias registradas na Somália. O livro de Annie Leonard (A história das coisas, 2011), obra já difundida em vídeo pela Internet, ajuda a constatar e dimensionar porque os ex-pescadores somalis (Guarda-Costas Voluntários da Somália) tornaram-se, na interpretação rasante da mídia internacional, “piratas”, quando, em verdade, lutam contra corsários de governos globalizantes nada exemplares. Mais evidências sobre esta somatória de afrontas ao ideal do “desenvolvimento sustentável”, está disponibilizado no site www.dotsub.com/view/8446e7d0-e5b4-496a-a6d2-38767e3b520a
Países que detêm reservas de água, minérios, petróleo e solos férteis (como é o caso do Brasil), precisam estar alertas, pois, como já deixou dito Milton Santos, há mais de uma interpretação de “globalização”, algumas interessantes, outras, nem tanto. E, até agora, a concepção de “desenvolvimento sustentável”, passando por análises sistêmicas, deixa claro que a visão linear é de comprometedora “inocência” visual.
Artigo divulgado originalmente na Edição 26 da Revista Geração Sustentável.
============================================================
Veja outros conteúdos dessa edição:
Matérias:
Entrevista: Elisa Prado (Tetra Pak)
Capa: Campos Gerais: um Paraná a ser conhecido
Visão Sustentável: Produtos concentrados fazem bem ao meio ambiente
Desenvolvimento Local: Setor de sustentabilidade ganha representatividade no Brasil
Artigos:
Leandro F. Bastos Martins: Promessa é dívida?
============================================================
Seja assinante da Geração Sustentável e ganhe o livro Eco Sustentabilidade
A revista Geração Sustentável faz uma promoção especial para você leitor que busca novos conhecimentos sobre o tema sustentabilidade corporativa.
Fazendo uma assinatura anual (R$ 59,90) da revista você ganha o livro “ECO SUSTENTABILIDADE: Dicas para tornar você e sua empresa sustentável” do consultor Evandro Razzoto.
Aproveite essa oportunidade e faça agora mesmo a sua assinatura!
*Promoção por tempo limitado
Nenhum comentário:
Postar um comentário