Jeferson
Dantas Navolar
Presidente
do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná (CAU/PR)
Durante
quase 80 anos, arquitetos e urbanistas conviveram com engenheiros de todas as
especialidades e agrônomos em um conselho multiprofissional. Depois de muitos
anos de batalha, entre discussões, elaboração de Projeto de Lei e tramitação no
Congresso Nacional, em 31 de dezembro de 2010, num dos últimos atos do governo
do presidente Lula, foi autorizada por Lei Federal a criação do Conselho de
Arquitetura e Urbanismo. A Lei nº 12.378 também veio para regulamentar o
exercício da profissão, entre outras providências. No Paraná, o Conselho está
em funcionamento há cerca de um ano e meio e tem como principais objetivos a institucionalização
da profissão de arquiteto e urbanista e a efetivação da presença desses
profissionais em todo o estado. Resultados parciais de um Censo realizado em
todo o Brasil apontam que no território paranaense há, aproximadamente, 8 mil
arquitetos cadastrados como pessoa física e cerca de 1,5 mil como pessoa
jurídica. Além disso, existem 189 municípios do estado sem a atuação desses
profissionais. Como forma de reverter esse quadro, diversas parcerias estão
sendo firmadas por meio do projeto Arquiteto Empreendedor, que faz parte do
Núcleo de Empreendedorismo, Sustentabilidade e Cidadania do Conselho, o NESC-CAU/PR.
Para abordar esses e outros aspectos dessa profissão essencial para a formação
da cidadania e para o desenvolvimento sustentável, ouvimos o primeiro e atual
presidente do CAU/PR, arquiteto Jeferson Dantas Navolar, que falou com
exclusividade para a revista:
O que representa a
criação de um conselho específico para os arquitetos e urbanistas?
A
batalha para que o CAU fosse criado durou cerca de 50 anos e passou por três
momentos importantes: o primeiro foi de harmonização e envolvimento das
entidades, o segundo foi de trâmite do Projeto de Lei no Congresso, com
diversas audiências, avaliação por várias entidades e discussões que duraram anos,
mas que serviram para que o PL para criação do Conselho fosse cada vez mais
aprimorado.
Por
fim, o terceiro momento foi o de participação da Casa Civil e da Presidência da
República para aprovação e sanção do projeto. É importante ressaltar que essa é
uma Lei que nasce após a Constituição de 1988. Ou seja, depois da consolidação
do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor, e, por isso, é um Conselho que
traz muito mais modernidade e agilidade em relação aos outros conselhos criados
antes da Constituição. Um Conselho novo, atual como o nosso, conta com uma
administração mais moderna, com menos papel e mais tecnologia. Dentro do
sistema multiprofissional, durante quase oito décadas, convivemos a maior parte
do tempo harmoniosamente, mas também com a ocorrência de sombreamento e disputas
de atribuição entre as profissões. As antigas e as novas engenharias foram se
organizando e muitas vezes tirando do arquiteto ou compartilhando conosco as
atribuições.
Essa era
uma contradição que também nos colocava na condição de "meio arquitetos",
ou seja, grande parte da produção da arquitetura ficou com a cara das engenharias.
Não há certo nem errado nisso tudo, é apenas uma constatação. O que
pretendemos, cada vez mais, é colocar aos poucos a cara do arquiteto e da
arquitetura no Conselho, já que agora nossas atribuições estão previstas em
Lei. Importante dizer que quem ganha com tudo isso é a sociedade.
Hoje, costumamos
dizer que uma das bandeiras que carregamos durante esse debate foi a de que a
sociedade estava sem direito à arquitetura. A valorização do arquiteto e
urbanista vai de encontro à melhoria dos espaços públicos. As cidades estão sem
arquitetura e urbanismo. Além disso, devemos ter mais cuidado com questões
regionais e culturais, e a criação do Conselho próprio proporcionará lidarmos
melhor com essa situação.
Quais são os benefícios da criação de um Conselho próprio
de arquitetos e urbanistas para os profissionais e para a sociedade?
Com a
criação do CAU, os arquitetos e a sociedade ganham mais atenção, mais fôlego e
força quando o assunto é o planejamento dos espaços públicos e privados.
Outro
diferencial é a adaptação e a utilização das novas tecnologias em todo tipo de
procedimento. Como exemplo de avanço, destaco também a não exigência de um novo
registro em cada unidade da federação que o profissional venha a exercer sua
profissão, uma vez que o registro no CAU é nacional.
Temos como ferramenta
mais importante na gestão do Conselho a utilização da tecnologia da informação.
Como utilizamos a informática como parceira, outras facilidades são
decorrentes, como possibilidade de registro on- -line e a emissão de certidões
virtuais, o que tem sido muito bem-entendido pelos profissionais. As novas carteiras
de identificação já foram elaboradas pensando nisso. Elas contam com chip, o
que permitirá que possam receber insumos, como informações sobre projetos ou
parcerias firmadas.
Em relação aos
valores que nos autorizaram a cobrar para a gestão do Conselho, é importante
ressaltar que eles são bem menores do que os cobrados anteriormente. O CAU não
é um Conselho que visa arrecadação. As taxas mínimas que praticamos representam
uma redução significativa no preço final da atuação dos profissionais, talvez
algo em torno de 10% do que era cobrado antes. Também defendemos a inclusão dos
arquitetos em mais projetos públicos e privados. Hoje, temos muitas gestões de prefeitos
sem um corpo técnico qualificado, sem ao menos um arquiteto para participar do
planejamento de parques, escolas e hospitais, o que certamente traz muitas
consequências.
Quais
são as principais bandeiras defendidas pelo CAU/PR? Ele segue os princípios do
Conselho Federal?
“Levar
arquitetura a quem não tem” e “Arquitetura é atribuição de arquiteto”. Essas
são as principais bandeiras, que surgiram da luta pela criação do Conselho e
continuam de pé nessa construção da sensibilização da sociedade em relação à
atuação do arquiteto e urbanista. Genericamente, podemos dizer que a maioria
dos CAUs no Brasil segue essa linha de pensamento.
É importante destacar que temos
liberdades administrativa e financeira previstas em Lei, mas sempre as normas
do Conselho nacional devem ser analisadas e espelhadas nas ações dos estados.
As plenárias estaduais existem exatamente para que as questões regionais surjam
e sejam abordadas. No Paraná, temos uma plenária com 15 conselheiros titulares
e 15 suplentes, estabelecida pelo colégio eleitoral em 2010, seguindo a proporcionalidade
dos profissionais registrados.
O
registro de pessoas física e jurídica no Conselho, bem como os trabalhos realizados
por esses profissionais, é obrigatório?
Sempre foi
obrigatório o registro de arquiteto e urbanista para o exercício da profissão,
assim como em qualquer outra profissão regulamentada no país.
Os
profissionais precisam comunicar ao Conselho o que estão fazendo. Porque isso?
Porque o trabalho do Conselho é justamente atuar em defesa da sociedade, fiscalizando
o exercício da profissão. Essa comunicação das atividades profissionais é
obrigatória e tem sido diária, on-line, o que a transforma imediatamente em insumo
para nossa atuação. Antes não era assim.
Por outro
lado, se tomamos conhecimento de obras sendo construídas sem a supervisão de um
arquiteto, nós vamos lá checar quem é o responsável, se é um leigo ou se tem um
engenheiro. É obrigatória a participação de arquiteto ou engenheiro na execução
das obras, e as parcerias entre ambos, principalmente em grandes obras, são
muito comuns. Exercer a profissão sem registro é ilegal. E para evitar esse
tipo de situação, temos uma parceria muito forte com as prefeituras e as
secretarias de urbanismo, as quais emitem as autorizações para construção.
Toda vez que
um profissional solicita um alvará junto ao órgão público ele precisa
apresentar o seu registro e comprovar que está habilitado para o projeto. Dessa
forma, a sociedade não corre risco, que é uma palavra muito comum hoje, seja
risco de desmoronamento, de enchente ou de desabamento.
Entre as atividades
previstas para serem realizadas pelo CAU está um Censo para identificar a
realidade profissional. Existe um resultado desse trabalho? Atualmente,
quantos arquitetos e urbanistas fazem parte do Conselho paranaense? Qual a
estimativa de novos profissionais ingressando no mercado anualmente?
No Paraná, estão
registrados no Conselho como pessoas físicas mais de 7,3 mil arquitetos, e
pouco mais de 1,4 mil como pessoas jurídicas. Esses são números preocupantes,
se pensarmos que apenas algo em torno de 20% dos profissionais estão
organizados empresarialmente E os outros 80% são o quê? Ainda há muita
informalidade, fato que se reflete na existência de profissionais sem direito à
aposentadoria, sem direito a crédito e muitos outros benefícios. Para fortalecer
a profissão, é preciso que os arquitetos sejam empreendedores, e para isso temos
que institucionalizar a participação do arquiteto na sociedade.
No Paraná, há
20 cursos de arquitetura autorizados, dos quais saem cerca de mil profissionais
por ano, ou seja, em 10 anos, dobraremos esse número. Por isso, é nosso papel incentivar
os arquitetos a serem empreendedores formais pelo bem deles e de toda a
sociedade. Essa realidade já era conhecida e foi comprovada pelo resultado
preliminar do Censo realizado em todo o país, que trouxe um panorama por
cidade.
Essa mesma pesquisa identificou que temos 189 municípios paranaenses
sem arquitetos. Ou seja, metade das prefeituras não tem arquiteto, seja como funcionário
público, seja como morador da cidade. Esse é um dado extremamente preocupante.
Como é que essas
prefeituras fazem a gestão do seu território, está lá o engenheiro civil
fazendo isso ou não há ninguém?
Como
está funcionando a migração do conselho anterior para o CAU? Todos os
arquitetos do Paraná já solicitaram, receberam a nova carteira profissional?
A migração foi
obrigatória e automática. Aconteceu em alguns estados com mais dificuldade e em
outros de forma mais fácil. No Paraná, a migração dos dados foi efetivada em
seis meses. O CREA tinha obrigação de passar os dados, e o CAU tinha o dever de
recadastrar e de fazer todo o atendimento. No Paraná, isso funcionou muito bem.
Em outros
estados, não foi assim. É importante dizer que o artigo da Lei que previa a
transferência do patrimônio de anos de arrecadação pelos arquitetos junto ao
antigo conselho foi vetado, por isso o único repasse para o novo Conselho foi o
referente à parte da arrecadação de 2011, o que nos possibilitou o início dos
trabalhos.
Em
determinados estados isso ainda não aconteceu. Nem todos os arquitetos
receberam suas carteiras profissionais porque nem todos se recadastraram.
Fizemos uma campanha forte em relação a isso, mas o recadastramento é voluntário.
Quase 85% dos profissionais do estado já atenderam ao nosso chamado.
No caso
das pessoas jurídicas, ainda não temos levantamento, mas estamos fazendo convocações
para o recadastramento o tempo todo. Para isso, estamos acionando órgãos públicos,
universidades, informando das atribuições dos arquitetos e como eles devem
agir.
Nova sede do CAU/PR ( Casa Mario de Mari)
Qual a relação entre
o CAU e o IAB?
O
Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) é uma entidade centenária, que antecedeu
inclusive a criação do CREA. O IAB sempre foi e continua sendo o local onde os
arquitetos brasileiros se expressam sobre aspectos culturais e políticos. No
Paraná, continuamos parceiros nesse sentido e não há sombreamento. O CAU tem atribuições
previstas em Lei, como fiscalizar a atuação do bom arquiteto, do mau arquiteto
e do leigo, bem como valorizar o trabalho do arquiteto em todo o Brasil.
O IAB é
uma entidade sem fins lucrativos, que tem força política intensa e atuação
consagrada, o que foi essencial para a criação do CAU. Sem o IAB e outras entidades,
é quase certo que o CAU não existiria.
Quais têm sido os principais desafios e conquistas neste
primeiro ano de implantação do Conselho?
O
principal desafio é, sem dúvida, compreender exatamente como está sendo
desenvolvida a atuação dos arquitetos e urbanistas no estado e no país: quem
somos, onde estamos e o que estamos fazendo, sem deixar de atender aos
profissionais.
Como conquistas,
temos resultados estatísticos extremamente positivos: saímos do CREA com uma
média mensal de 6 mil Anotações de Responsabilidade Técnica (ART), e hoje, com
pouco mais de um ano de funcionamento, ultrapassamos a marca de 8 mil Registros
de Responsabilidade Técnica (RRT) mensais. Tudo isso porque o sistema está
funcionando, é barato, os profissionais aderiram e as prefeituras também.
Assim, podemos
dizer que fomos eficientes nessa transição, uma vez que já temos um volume 25%
superior de registros em relação ao antigo conselho. Dessa forma, digo que
estamos no caminho certo, o que é uma grande conquista.
Quais são as metas para os
próximos anos?
Uma das
principais é a instalação, ainda este ano, de cinco escritórios regionais do
CAU. Apesar de termos a tecnologia da informação a nosso favor, nós temos que
estar mais presentes e próximos dos profissionais.
Fomos
autorizados pela plenária do Conselho a instalar escritórios regionais em
Maringá, Londrina, Cascavel e Pato Branco e, em breve, também em Guarapuava.
Além disso, no final de junho estaremos inaugurando nossa sede definitiva de
Curitiba, localizada na Casa Mário de Mari, uma residência modernista do início
da década de 60, que é uma UIP - Unidade de Interesse de Preservação.
Esse
tipo de ação, a instalação de escritórios regionais, vai de encontro ao nosso
objetivo de aumentar a presença da Arquitetura na sociedade, assim como a
participação efetiva dos arquitetos em todas as regiões do estado.
Para o CAU, a
sociedade já tem percepção das diferenças entre o trabalho do arquiteto e do
engenheiro? Qual seria a forma correta de diferenciação?
A
diferença básica é que o engenheiro é da área de tecnologia e o arquiteto é da
área de humanas. Eu acho que esse é o nosso maior desafio, fazer a sociedade entender
a diferença entre o produto do arquiteto do produto do engenheiro. Como
exemplo, cito a Argentina e o Uruguai, países nos quais não há nenhum projeto
que não tenha participação de um arquiteto.
Essa é
uma questão histórica, que tem relação com a diferença entre as ex-colônias
portuguesas e as ex-colônias espanholas na ocupação do território.
As
ex-colônias espanholas preocupavam-se mais com a valorização dos espaços
públicos, enquanto as portuguesas priorizaram os espaços privados. Esses são
dogmas que nós herdamos. Por isso, dizemos que o Brasil é um dos países do
Ocidente em que o direito à propriedade é um dos mais exacerbados do mundo,
onde o coletivo está em segundo plano. E de que forma isso afeta o trabalho dos
arquitetos? Na gestão dos espaços públicos e privados.
Então,
esse é um paradigma que deve ser revisto. É importante destacar também que há
apenas 10 anos temos uma norma de administração pública, que é o Estatuto das
Cidades, no qual o poder público mostrou para a sociedade como se faz
administração do território urbano, por reivindicação dos arquitetos.
Matérias:
- Capa: Arquiteto Empreendedor
- Espaço Arquitetura
- Construções Sustentáveis: Integração e Sustentabilidade desde a concepção do projeto
- Responsabilidade Social Corporativa: (CPCE Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial) Implantação de projetos socioambientais requer planejamento
- Responsabilidade Ambiental: Cultivando Água Boa
- Desenvolvimento Local: Aliança Paraná Sustentável
- Desenvolvimento Social: CEF apoia empreendimentos habitacionais sustentáveis
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Artigos:
- Artigo: Vamos de carro ou de metrô? (Jerônimo Mendes)
- Artigo: Engajando e cultivando talentos (Rafael Giuliano)
- Artigo: Arquitetura Sustentável: um processo (Ivan Dutra)
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